*Por Fernanda Krentkowski, empresária
Como estudiosa e curiosa que sou, com anos de experiência trabalhando com vidro temperado, sinto-me compelida a abordar o intrigante tópico da quebra aparentemente espontânea deste material resistente e versátil. Ao longo de minha jornada como empresária do ramo da serralheria de alumínio, deparei-me com diversos mitos e equívocos sobre o vidro temperado e a quebra supostamente "sem motivo" é um dos mais comuns e mal compreendidos. Neste artigo, compartilharei um pouco do que garimpei sobre esse fenômeno, desmistificando-o e fornecendo uma perspectiva fundamentada sobre o tema.
A ARTE DO VIDRO TEMPERADO
Antes de mergulharmos no enigma da quebra espontânea, é essencial entender o processo de fabricação do vidro temperado e as propriedades que o tornam uma escolha tão popular em diversas aplicações. O vidro temperado é criado através de um método de têmpera, que envolve um processo cuidadosamente controlado de aquecimento acima dos 600 ºC e resfriamento rápido. Esse tratamento térmico cria uma camada superficial comprimida e um núcleo tensionado, o que aumenta significativamente sua resistência mecânica em cinco vezes e, torna-o mais seguro em caso de quebra, fragmentando-o em pequenos pedaços arredondados com cerca de 1cm de diâmetro em vez de estilhaços perigosos.
A QUEBRA ESPONTÂNEA: MITO OU REALIDADE?
Alegações sobre a quebra espontânea do vidro temperado podem gerar apreensão e insegurança nos consumidores. É importante destacar que o termo "quebra espontânea" pode ser enganador e carece de uma análise completa do que está realmente acontecendo. Em suma, existem duas hipóteses para explicar a quebra espontânea do vidro temperado.
1. Contaminação com Sulfeto de Níquel: Os constituintes básicos do vidro moderno são 72% sílica, 13% soda Ash, 12% calcário e mais uma pequena quantidade de feldspato. Entretanto, no processo de fabricação do vidro pode ocorrer a contaminação com uma substância não desejada: o sulfeto de níquel.
Um dos primeiros autores a estudar esse fenômeno foi o engenheiro elétrico especializado em processo de têmpera de vidro chamado Jonathan Barr. Ele publicou o livro “The Glass Tempering Handbook - Understanding the Glass Tempering Process” (“O Manual de Têmpera de Vidro - Entendendo o Processo de Vidro Temperado”) no qual explica que essa partícula de sulfeto de níquel pode contaminar a chapa de vidro ainda na sua fabricação durante o processo de flutuação no estanho, e que o sulfeto de níquel tem duas conformações moleculares. A fase Alfa, quando o vidro está quente, e a fase Beta, é quando o vidro está frio.
Durante o processo de têmpera, quando o “vidro contaminado” é aquecido a mais de 600°C, o sulfeto de níquel entra na conformação Alfa e, quando resfriado, retorna a conformação Beta, sendo essa última até 4% menor em tamanho do que na fase Alfa. Esse retorno à fase Beta, ou seja, ao tamanho menor, pode ocorrer em horas, dias ou em anos. Por isso o termo “quebra espontânea”.
Atualmente, as indústrias que produzem o vidro, possuem processos altamente controlados e padronizados para que não ocorra essa contaminação indesejada. Assim, essa “quebra espontânea” causada pela presença do sulfeto de níquel é raríssima.
DANOS E TENSÕES EXTERNAS
O vidro temperado é notável por sua capacidade de suportar choques e pressões consideráveis. No entanto, mesmo a resistência inerente do vidro tem seus limites. Qualquer dano anterior, como arranhões ou lascas, pode enfraquecer a integridade estrutural do vidro e, com o tempo, levar à quebra sob tensões adicionais.
O vidro temperado é considerado autoportante podendo ser instalado somente com ferragens, como é o caso do box de banheiro tradicional, sem a necessidade de estruturas ou quadros em volta do vidro. Alguns dos principais benefícios desse tipo de instalação é o baixo custo do produto, a rapidez na instalação e o efeito visual arquitetônico limpo e minimalista. Entre as desvantagens encontram-se manutenções ou regulagens nas ferragens instaladas diretamente no vidro temperado. Essas devem ser realizadas por profissional vidraceiro com experiência a fim de evitar danos no vidro que podem levar a uma “quebra repentina”.
Os danos causados por batidas, manutenções ou instalações incorretas normalmente não são percebidos de imediato, sendo evidenciados, somente quando ocorre a “quebra aparentemente sem causa” do vidro.
Como esse processo não pode ser supervisionado e controlado, torna-se a causa mais comum de quebra espontânea dos vidros temperados.
A IMPORTÂNCIA DA QUALIDADE E INSTALAÇÃO ADEQUADA
Como mestre vidreiro, destaco que a qualidade do vidro temperado e sua instalação são cruciais para garantir sua durabilidade e segurança. A escolha de um fornecedor confiável e experiente é essencial para minimizar defeitos de fabricação e garantir que o vidro atenda a todas as normas de qualidade.
Da mesma forma, uma instalação adequada é um fator determinante para a prevenção de quebras prematuras. Uma instalação mal executada pode criar tensões desnecessárias no vidro ou limitar sua capacidade de expansão e contração natural em resposta às mudanças térmicas.
Em suma, o vidro temperado não quebra espontaneamente. O processo pode ser explicado por fatores como defeitos de fabricação, danos prévios e tensões externas. Os núcleos de níquel-sulfeto também podem desempenhar seu papel, embora sejam casos raros. O vidro temperado continua sendo uma escolha segura e confiável para várias aplicações, desde que seja devidamente fabricado, instalado e mantido.
Para garantir a durabilidade e segurança do vidro temperado, é essencial que ele seja produzido por fabricantes confiáveis e que seja instalado e mantido adequadamente, evitando danos ou tensões excessivas que possam levar à quebra. Além disso, em caso de quebra, a limpeza e o reparo devem ser realizados por profissionais qualificados para garantir a substituição adequada do vidro. Com essas precauções, o vidro temperado continuará a ser uma excelente escolha para diversas aplicações em nossa vida cotidiana.
*Os artigos publicados com assinatura são de responsabilidade dos respectivos autores e podem não interpretar a opinião da revista. A publicação tem o objetivo de estimular o debate e de refletir as diversas tendências do mercado, com foco na evolução da indústria de esquadrias e vidro.
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